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quinta-feira, 19 de maio de 2016

ANA VIDIGAL


A Ana Vidigal (Lisboa, 1960) trabalha em casa, ao cimo de uma rua em Alfama. A partir de fora de casa, nada deixa antever que se vai entrar num prédio tão bonito e silencioso. A Ana recebe-me cheia de energia, apesar de mais tarde dizer que 'já não é o que era, que antes podia carregar telas escada acima, escada abaixo, e no dia seguinte estar fina e agora lá vêm as dores de costas!'. Duas horas e meia a mexer e ver materiais, fotografias e a conversar animadamente sem nunca parar, fez deste atelier o mais mexido que visitei.

O material orgainzado por cores.

Depois de dois lances de escadas, há um pequeno hall que entra para a sala, ampla e bem decorada. À direita, a biblioteca, já parte do atelier. 'Pode entrar-se directamente para o espaço de trabalho, que é metade da casa. Venho da rua e já estou onde quero estar, mas gosto de não ter que passar por uma série de sítios para ir buscar um copo de água'. Assim, a casa foi desenhada para fazer um círculo: biblioteca, atelier, cozinha, casa de jantar, sala e biblioteca outra vez.



É impressionante a quantidade de luz que entra casa adentro. Os tectos altos e os azulejos com padrões desencontrados dão ao lugar uma harmonia rara. 'Vivo nesta rua há décadas; esta casa, que era uma escola, pertencia ao meu pai. Eu vivia no andar em baixo. Depois, fiz umas obras, mudei para aqui e transformei metade do espaço em atelier. Já tive um atelier fora de casa, mas prefiro dentro: é que, no outro, os meus dias eram passados a fazer outras coisas em vez de trabalhar! Sou preguiçosa e, por isso, muito disciplinada e o atelier fora fazia com que descambasse'.

Pequena parte da biblioteca

Nada é caótico e a Ana assegura que faz parte da sua personalidade; a arrumação não vem de um esforço para deixar tudo impecável. Até as pequenas notas que deixa a si própria são muito explícitas e com letra bem desenhada. Mas o seu material não está todo no atelier nem na biblioteca, como pode parecer à primeira vista. 'Partilho com os meus irmãos um sítio onde arrumamos algumas coisas, esse sim, é fora de casa. Quando não tenho nada para fazer, vou lá ter ideias, abrir caixas, mexer em coisas.'

Abre-se um conjunto de gavetas onde há
muito para ver, para trabalhar

Descendo a sua rua, entramos numa outra casa. Passada uma sala com um amontoado de caixas, outra com outros objectos, subimos umas escadas de madeira até ao sótão. É aí que guarda tudo o que ainda não está a ser utilizado. 'Nem sei o que é que aqui está, vou abrindo, vou vendo e quando me agrada, levo para o atelier'.

Colecção de agulhas no sótão

'Um bom dia de trabalho para mim é quando consigo fazer alguma coisa, quando fico satisfeita com a coisa, por mais pequena que seja. Não tem que ser 'começar uma peça de manhã e acabar à tarde'; às vezes isso acontece, mas só depois de um processo de maturação que levou ao dia em que consegui concretizar o trabalho. Bem... Um bom dia de trabalho a-sério-a-sério é quando vou ao cinema ver dois filmes de seguida, para chegar ao atelier e conseguir trabalhar. Isso é trabalho, claro, eu trabalho a partir do que me aparece.'



'Era do meu pai, acabei por ficar com estas coisas todas.
Não deito nada fora'.
Ainda no sótão, a Ana abriu um álbum de fotografias da sua primeira exposição, na Sociedade Nacional de Belas Artes, em Lisboa. Tinha 20 anos, estava no segundo ano em Pintura na FBAUL.



De regresso a casa, há ainda muito por ver. Com o seu ar contente e entusiasmado, numa salinha anexa à biblioteca, abre um móvel com umas quantas gavetas e deixa-me à vontade. 'Podes fotografar tudo. Esta gaveta tem trabalhos que me ofereceram ou trocas que fiz. Este, por exemplo, é do Jorge Catarino, gosto muito!'

Uma gaveta com trabalhos de outros artistas.
Na mão: Jorge Catarino




'Assim que apanho estes moldes, compro logo. Isto é
uma coisa que já não se faz, ninguém
quer isto para nada.
Quando vou a Nova Iorque, trago sempre
uma série deles. Encontram-se em cada canto.'

Para além da biblioteca, desta salinha e do sótão fora de casa, faz ainda parte da zona das arrumações a casa do seu irmão, acima da sua. 'Era impensável para mim manter tudo no atelier, nem me ia poder mexer! Lá em cima não há móveis, podem dar-se umas boas festas!'


Chegamos, por fim, ao atelier propriamente dito. Nesta altura, deixou-me sozinha e eu apreciei coisa por coisa.





Quando perguntei se mantinha diários gráficos, respondeu que não, mas que tem em curso um livro de artista. 'Dou-os todos, ofereço aos amigos quando fazem anos, não os quero para mim.'








'Este é o original de um trabalho que é uma
ampliação desta imagem,  trabalhada.
Colo sempre os originais e assim
já ninguém os usa.'

Fim.
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A Ana Vidigal é representada pela galeria Baginski
A sua página de facebook é esta e o seu site, este.

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