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segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

PEDRO ZAMITH


Fiz de comboio o percurso Campolide-Cascais e o PEDRO ZAMITH ficou de me ir buscar à estação. Tínhamos combinado a visita ao atelier alguns dias antes, que entretanto seria adiada. A nossa conversa já estava condicionada à partida pelo meu entusiasmo, mas eu não esperava o rápido entendimento.



O Pedro vive numa casa grande, colorida e arejada, onde os dois filhos circulam à vontade, inclusive no espaço de trabalho. Divide-se em três pisos: o primeiro e o segundo são de habitação e o rés-de-chão é uma garagem grande com pequenos anexos laterais. Um dos anexos é o espaço do seu atelier.

Assim que se entra, sob uma luz frigorífica, as cores fortes dos trabalhos, as perspectivas que sugam o observador e a frase HELLCOME TO MY WORLD saltam à vista: parece que se entrou numa pequena fábrica de tinta. Alguns trabalhos por acabar, pousados nos cavaletes, outros pendurados nas paredes e uma série de recordações da sua vida pessoal compõem o ambiente.



Para além de artista plástico, também dá aulas numa escola internacional em Cascais durante todo o dia. A meio da tarde, e nas semanas em que não está com os filhos, dedica-se ao desenho, à pintura e à gestão dos projectos que tem pendentes. Durante toda a nossa conversa, nunca percebi quando é que o Pedro dorme: o seu empenho e espírito crítico são invejáveis e os trabalhos são reflexo disso.



Por exemplo, enquanto eu preparava a câmara para filmar, disse-me que ainda não tinha tido tempo de fazer o desenho de natal para colocar no seu facebook, que ia levar os filhos ao jogo do Benfica naquela noite e ainda não tinha comprado os bilhetes, que ia receber um amigo com o respectivo filho dali a umas horas e ainda não lhe tinha avisado que ia sair e que tinha que marcar uma consulta de pediatria. No mesmo tempo em que eu preparei a câmara para filmar e ajustava a luz, o Pedro fez tudo isto. Eu pensei que talvez me tenha cruzado com uma das pessoas mais rápidas e eficazes de sempre.



O seu atelier tem este ritmo: parece que num dia está de uma forma, noutro dia está absolutamente diferente. As cadeiras não têm um lugar fixo, tudo é fluido e os desenhos que não estão concluídos são bons exemplos desta fluidez. Quando lhe perguntei se o seu trabalho só podia ser feito naquele espaço, o Pedro respondeu-me que não, porque o espaço de trabalho era duplo: se por um lado era o do atelier, do género covil, por outro ele é um homem cosmopolita e os personagens que traz para dentro do seu atelier são os clichés do quotidiano. Mas aquele espaço influenciava muito o seu método de trabalho e isso, por sua vez, influenciava aquilo que fazia.



O Pedro só pára de falar quando interrompemos e raramente perde a linha de raciocínio. Utiliza os seus desenhos como exemplo para tudo e uma das questões que se coloca é a de desenhar poucas mulheres. Tem alguns problemas com isso, porque aquilo que absorve delas não são os clichés que capta rapidamente noutras pessoas, mas a sensibilidade e delicadeza. Confessa que talvez possa ser um preconceito, que as mulheres também têm os seus clichés, mas só as utiliza quando pretende formas sinuosas nos seus trabalhos.



A atmosfera do seu atelier não é claustrofóbica, apesar de ser numa garagem. Parece que cada parede se desdobra para dentro dos desenhos expostos e o atelier continua para esses espaços. A sensação é a mesma que tive quando vi uma exposição sua há uns dois anos. Quando se está no seu atelier não se espera ser sugado para dentro dos desenhos grotescos, mas aquilo que é mais impressionante é a sensação de espelho. Todos eles vinham ter comigo e olhavam para mim de uma forma intimidante, como se eu não pudesse ignorar que fazia também parte daquele cenário. Não é assustador, mas a minha capacidade de abstracção funcionou mal. 



Sempre utilizou a perspectiva, desde que se lembra de desenhar em criança; quando chegou às Belas-Artes e aprendeu a desenhá-las com dois e três pontos de fuga, descobriu aquilo que andava à procura. A forma como fala da perspectiva é muito bonita e passa a sensação de que pôde finalmente fazer-nos ver o mundo que só está dentro da sua cabeça.
Mas não foram só as Belas-Artes que lhe moldaram o trabalho: antes disso frequentou a Escola Superior de Teatro e Cinema, no curso de Cenografia e Figurinos. A relação é clara.

Para ouvir o Pedro falar, 

Sem dúvida que o espaço de trabalho do Pedro é motivador. Os trabalhos são definitivamente daquela pessoa. Como diz a determinada altura, 'o meu trabalho só poderia ser feito por mim. As características de cada pessoa estão plasmadas directamente em cada quadro: só não vê quem se recusa'. A sua boa disposição, crítica social certeira e a extroversão transformam qualquer conversa num momento bem passado.


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