Na casa da Mónica, tudo é impecável e o cheiro é neutro. Não há uma migalha no chão ou uma almofada fora do lugar. Fala-se baixo, não há brinquedos desarrumados e aquele espaço que está destinado a ser o seu atelier é só uma pequena mesa desarrumada com coisas que não precisa. Há uma tela esticada na parede, no início, mas que passa despercebida.
A Mónica 'partilha' o atelier com o António, seu filho do qual toma conta a tempo inteiro. |
A Mónica não trabalha no meio da confusão. 'Não gosto de bagunça, ninguém aqui gosta, somos arrumados. O meu espaço de trabalho nem é bem aqui. Ou melhor: é só aqui quando eu estou em casa'.
Efectivamente. Para a próxima exposição, em Abril na Miguel Justino Contemporary Art, mostra trabalho que não é de gestos longos, como havia feito em exposições do início. Está contida: muitos movimentos em pouco espaço. Cada vez mais visceral.
Na próxima exposição, movimentos pequenos vão dar continuidade a 'cartas de amor' que a Mónica havia desenhado. |
'É, antes eu tinha um movimento de expansão. Queria pinceladas grandes, gestos maiores do que eu, como se estivesse a explodir. Tinha acabado de vir do Brasil e deixei tudo. Foi um corte, Portugal foi um corte com o meu passado.' Aquilo que havia produzido no Brasil, deixou ou queimou. Não quis deixar rasto, quase quis fazer-se desaparecer de lá. Chegou a Portugal e fez por se apropriar do espaço que era agora seu: ser o maior possível.
Este é um trabalho pré-maternidade. 'Cordão Umbilical', 2012 |
Lá no Brasil, trabalhava com serigrafia e outras técnicas que já não utiliza agora. Apesar disso, continua a crescer por outros lados. |
Mas a Mónica nunca deixou de trabalhar. Na verdade, utiliza uma frase da Ana Jotta para ilustrar aquilo que quer dizer: nasci artista, já nasci assim”, diz-nos a dada altura. O que quer isso dizer? “É como viver, como respirar. Há pessoas que têm um ADN assim. Ser artista é ser uma espécie de feiticeiro da tribo. Uma espécie de mediador. Uma antena. (fonte)
'Tenho sempre comigo esta entrevista que a Ana Jotta deu ao Público. Eu penso como ela'. |
Agora está a tricotar ninhos. Engessando-os, pretende fazer uma mandala no chão da galeria para os expor. 'É uma forma de preservar o berço. O pássaro sai do ninho, mas o ninho fica. Eu quero fossilizá-los e por isso cubro-os de gesso. Há partes do ninho que se mantêm, há momentos em que se pode ver o fio através do gesso. Isso é para dizer que há ninho ali em baixo, sim'.
Os ninhos antes de serem engessados. Têm cores dos diferentes orixás de Candomblé. 'Orixás correspondem a santos da religião católica'. |
Essa violência de que fala e que a fez cortar com a sua origem está presente na sua linha de trabalho: desde a maternidade ao retorno a alguns materiais que se utilizam no seu país - o fio com que tece os ninhos é um deles - a Mónica mantém o espírito muito presente. 'Não quero voltar, mas há uma espécie de retorno através do meu trabalho, uma espécie de fazer as pazes com o passado'.
____________________
Senti necessidade, porque a Mónica trabalha em vários locais,
de fazer um vídeo com o seu processo e com algumas explicações
na primeira pessoa.
Assim sendo, em breve, estará disponível aqui:
Mónica Mindelis - pt. II
Bonito!
ResponderEliminarMuito bom!
ResponderEliminar