Aba Dropdown

segunda-feira, 7 de março de 2016

MÓNICA MINDELIS - pt. I

Subi pelo elevador do prédio na rua por trás da minha e nem precisei de bater à porta: a Mónica Mindelis (São Paulo, 1978) estava à minha espera, aproveitando a sesta do bebé para trabalhar. O tapete da entrada conjugava dois sapatinhos minúsculos e duas sabrinas, perfeitamente alinhados.

Na casa da Mónica, tudo é impecável e o cheiro é neutro. Não há uma migalha no chão ou uma almofada fora do lugar. Fala-se baixo, não há brinquedos desarrumados e aquele espaço que está destinado a ser o seu atelier é só uma pequena mesa desarrumada com coisas que não precisa. Há uma tela esticada na parede, no início, mas que passa despercebida.

A Mónica 'partilha' o atelier com o António,
seu filho do qual toma conta
a tempo inteiro.

A Mónica não trabalha no meio da confusão. 'Não gosto de bagunça, ninguém aqui gosta, somos arrumados. O meu espaço de trabalho nem é bem aqui. Ou melhor: é só aqui quando eu estou em casa'.

Efectivamente. Para a próxima exposição, em Abril na Miguel Justino Contemporary Art, mostra trabalho que não é de gestos longos, como havia feito em exposições do início. Está contida: muitos movimentos em pouco espaço. Cada vez mais visceral.

Na próxima exposição, movimentos pequenos
vão dar continuidade a 'cartas de amor' que
a Mónica havia desenhado.


'É, antes eu tinha um movimento de expansão. Queria pinceladas grandes, gestos maiores do que eu, como se estivesse a explodir. Tinha acabado de vir do Brasil e deixei tudo. Foi um corte, Portugal foi um corte com o meu passado.' Aquilo que havia produzido no Brasil, deixou ou queimou. Não quis deixar rasto, quase quis fazer-se desaparecer de lá. Chegou a Portugal e fez por se apropriar do espaço que era agora seu: ser o maior possível.

Este é um trabalho pré-maternidade.
'Cordão Umbilical', 2012
'A maternidade veio mudar-me. Eu tomei uma decisão, que agora me faz sentir presa nesta casa, mas foi a que eu escolhi. Não me arrependo de ter ficado sem trabalhar durante um ano'.

Lá no Brasil, trabalhava com serigrafia
e outras técnicas que já não
utiliza agora.
Apesar disso, continua a crescer por outros lados.

Mas a Mónica nunca deixou de trabalhar. Na verdade, utiliza uma frase da Ana Jotta para ilustrar aquilo que quer dizer: nasci artista, já nasci assim”, diz-nos a dada altura. O que quer isso dizer? “É como viver, como respirar. Há pessoas que têm um ADN assim. Ser artista é ser uma espécie de feiticeiro da tribo. Uma espécie de mediador. Uma antena. (fonte)

'Tenho sempre comigo esta entrevista que a Ana Jotta
deu ao Público. Eu penso como ela'.

Agora está a tricotar ninhos. Engessando-os, pretende fazer uma mandala no chão da galeria para os expor. 'É uma forma de preservar o berço. O pássaro sai do ninho, mas o ninho fica. Eu quero fossilizá-los e por isso cubro-os de gesso. Há partes do ninho que se mantêm, há momentos em que se pode ver o fio através do gesso. Isso é para dizer que há ninho ali em baixo, sim'.

Os ninhos antes de serem engessados.
Têm cores dos diferentes orixás de Candomblé.
'Orixás correspondem a santos da religião católica'.
É porque pode tricotar em qualquer lugar que a artista sai de casa, por vezes, para trabalhar. 'Vou ao jardim, estou concentrada nisto, mas a pensar noutras coisas'. A sua relação com o espaço é privilegiada: pode estar a trabalhar em qualquer lugar, desde que concentrada. Arrisco a dizer que isso se deve a ter mudado de país. 'Podes não ter bem essa noção, mas é muito violento vir para um país onde se conhece pouco, só das férias. Já cá tinha estado, mas...'.

Essa violência de que fala e que a fez cortar com a sua origem está presente na sua linha de trabalho: desde a maternidade ao retorno a alguns materiais que se utilizam no seu país - o fio com que tece os ninhos é um deles - a Mónica mantém o espírito muito presente. 'Não quero voltar, mas há uma espécie de retorno através do meu trabalho, uma espécie de fazer as pazes com o passado'.

____________________

Senti necessidade, porque a Mónica trabalha em vários locais,
de fazer um vídeo com o seu processo e com algumas explicações
na primeira pessoa.

Assim sendo, em breve, estará disponível aqui: 
Mónica Mindelis - pt. II

2 comentários: